quarta-feira, 1 de junho de 2011

Canário do reino

Hoje estou especialmente carente de Brasil.  Já entendi que sempre sentirei saudades. Sinto muita falta do sabor da comida, dos domingos na vovó, dos amigos na mesa de bar, daquela energia frenética de São Paulo e daquele tal de samba, suor e cerveja.

Mas também acho que não conseguirei viver sem sentir falta de San Francisco. Falta do barulho surdo dos navios à noite, do tom de azul do céu no inverno, do ritmo tranquilo de vida apreciando o verde e o mar, e da luz do farol de Alcatraz rasgando minha janela de tempos em tempos.

Apesar da saudade, eu não me sinto incompleta. Pelo contrário, acho que me tornei esse ser meio "híbrido", cheio de sensações opostas mas que somehow coexistem. Mas hoje, queria mesmo-mesmo, um chopinho na calçada. Só.

4 comentários:

  1. Amei este post amiga! Sei bem como é essa sensação! Estamos ai sentindo falta daqui, mas SF já está no seu coração e na sua vida! Quando voltar para a vida frenética de SP sentirá uma falta da vida daí, dos cheiros e sons! Love you, miss you!

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  2. Ai Pouls.. devido às proporções me sinto assim.. claro que não estou longe assim.. deve ser difícil..
    Tem um texto que a Carol postou no blog dela. Trata exatamente disso. Se quiser ver direto no blog: nuestrasestorias.blogspot.com senão
    copiei abaixo pra vc.
    Bj!
    Saudade!
    Love you


    Vó Rosa nasceu na Espanha. Cresceu durante a República e se exilou quando acabou a guerra. Na Argentina teve outra vida, outra família e muitos netos. Lá, Rosa perdeu suas raízes, ou ganhou novas, ou ambas coisas. Foi feliz e infeliz, conheceu democracias e ditaduras, fartura e miséria. A Argentina, em síntese, pareceu transformar-se em seu destino. Mas depois de ficar viúva, Rosa quis voltar à Espanha para encontrar sua irmã, que permanecera em seu país natal. A irmã espanhola a recebeu desejosa de inaugurar de novo o tempo. O reencontro trouxe emoções, surpresas e conversas durante todo o ano. Neste período, a família argentina de Rosa não deixou de telefonar pedindo seu regresso. Voltar como, se acabo de voltar?- pensava ela ao escutar a voz dos filhos do outro lado da linha, enquanto olhava para as rugas da irmã mais nova.

    Com o passar dos meses, Vó Rosa começou a hesitar. Recuperara a irmã e os lugares da infância, mas sentia saudade dos outros parentes, suas outras ruas. Após numerosos telefonemas, Rosa acabou aceitando as passagens de avião que lhe deram. Arrumou novamente as malas e, uma tarde, se dirigiu ao aeroporto de Málaga para voar à Argentina. Na manhã seguinte, sua família ligou para a Espanha preocupada. Cadê a vovó? Seu avião havia pousado sem ela a bordo. Sua irmã não sabia de nada. Rosa não havia voltado nem telefonado.

    Às pressas, sua irmã pegou um táxi ao aeroporto para perguntar por ela. Logo em seguida, a encontrou sentada em uma destas salas de espera, quietinha, olhando de forma ausente os painéis dos voos. Vendo mudar os lugares, os horários, as companhias. Estava assim o dia inteiro. Havia perdido o avião e os seguintes. Não tinha trocado de roupa. Parecia tranquila.

    Quando Vó Rosa pousou finalmente em Buenos Aires, seus familiares atribuíram seu comportamento à senilidade que, por momentos, dava indícios nela. Eu prefiro pensar que Rosa teve um insuportável acesso de lucidez. Que passou 24 horas refletindo de frente para o painel dos destinos, meditando quem era e de que lado estava, no único lugar do mundo onde não se está em nenhuma parte: o aeroporto. Quero pensar que Rosa, antes de voltar para seus netos, averiguou para quê serviam as esperas, o estado de trânsito e os passarinhos que voavam no telhado.
    * Andrés Neuman nasceu em 1977 em Buenos Aires onde passou sua infância. Hoje vive em Granada, sul da Espanha, em cuja universidade foi professor de Literatura hispano-americana. Recebeu vários prêmios e esteve mês pasado no FLIP , a Feira Literária de Paraty. Sou fã dele e acho lindíssimo este texto!! Parecido com este tema, há o filme de 2001, "Herencia", da argentina Paula Hernández.

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  3. Faltou esta frase!!! Também fazia parte desse post:

    "Pode-se até começar a sentirse chez-soi, 'em casa', em qualquer lugar,
    mas o preço que se paga é a aceitação de que em lugar algum
    se vai estar total e plenamente em casa. (...)
    As 'identidades' flutuam no ar."

    Zygmunt Bauman
    nascido na Polônia e naturalizado britânico.

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